O Rádio envelheceu e segue forte. Mas poucos se deram conta disso

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Há pelo menos 4 anos venho acompanhando uma mudança discreta e ascendente do rádio a nível mundial. Uma mudança que, infelizmente, poucos se deram conta. Quem está ligado nesse movimento, nada de braçada em águas tranquilas.

O Rádio envelheceu.
Essa afirmação não é em tom pejorativo ou traz algum tipo de notícia ruim.

O fato é que o forte público do rádio, que comandava a audiência há 20 anos, não são mais os adolescentes. Os adolescentes atuais seguem no Spotify, escolhendo o que querem ouvir.

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Os jovens de outrora hoje são adultos, muitos casados, com filhos. Têm gosto musical peculiar e não conseguem se acostumar com as músicas atuais. Até curtem uma coisa ou outra, mas seguem ouvindo as mesmas canções que ouviam desde crianças.

São formadores de opinião, movem a classe trabalhadora e o mercado de consumo. Acompanham os noticiários pelas ondas do FM, se ligam em promoções e novidades que os comerciais apresentam.

Mas por que essa “idade de ouro” do rádio continua a crescer, num mundo em que o jovem parece só falar por áudio on‑demand e podcast? A resposta está nos números.

Segundo o Inside Áudio 2024, o rádio atinge 79% da população brasileira diariamente, com média de 3h55min de escuta por dia.

Além disso, as faixas etárias revelam que 60% da audiência está entre 25 e 54 anos, apenas 17% têm de 15 a 24 anos e 23% são ouvintes acima de 55 anos.

Esse perfil descreve exatamente quem era adolescente nos idos de 2000: nascidos em meados dos anos 1990, hoje entre 30 e 40 anos — a faixa com maior poder aquisitivo e influência no mercado. Esses “nativos do rádio” permaneceram fiéis ao meio, tornando‑se o público‑alvo ideal para anunciantes e programadores.

As emissoras que perceberam esse movimento migraram do pop genérico e do sertanejo atual para o formato Adulto‑Contemporâneo, mesclando hits dos anos 80, 90 e início dos 2000 com os lançamentos que ainda fazem sentido para essa geração. Estações como Antena 1 e Alpha FM já figuram entre as três mais ouvidas em São Paulo, a maior cidade das Américas, como mostra esta análise do portal Tudo Rádio. Aliás, a Alpha abriu afiliada em Florianópolis esta semana, mais um sinal desse investimento no “novo” público do rádio.

A própria Transamérica Pop, que sempre foi porta‑voz dos sucessos do momento, passou a adotar um estilo “jovem adulto contemporâneo” recentemente, buscando conquistar quem hoje tem entre 25 e 49 anos. Essa mudança já vinha sendo testada desde 2019 e se consolidou nos últimos meses.

Não é só no Brasil. Nos Estados Unidos, o formato Adulto‑Contemporâneo (AC) ganhou 9% de participação de audiência entre adultos 18+ e impressionantes 17% entre os 18–34 anos entre o terceiro e o quarto trimestre de 2024, segundo a pesquisa Nielsen divulgada pela Radio Ink.

E onde o digital impera, o rádio online floresce: a Antena 1 alcançou 5,2 milhões de ouvintes únicos por mês no Extended Radio da Kantar IBOPE Media — que combina o FM com o streaming — como mostra esta reportagem.

Enquanto isso, as emissoras que permanecem tocando apenas sertanejo atual ou pop genérico veem sua relevância cair. O jovem engajado em playlists algorítmicas não encontra ali o sabor afetivo que assina sua história sonora.

Daqui a 20 anos, os adolescentes que hoje buscam estilos próprios em plataformas sob demanda voltarão aos rádios para encontrar o repertório que marcou suas trajetórias — e, acima de tudo, a conexão humana proporcionada pelo locutor ao vivo. Aquele momento em que “ê, alô, Ouvinte!” ainda soa como um abraço.

Portanto, as rádios que se mantêm atentas ao envelhecimento de seu público — investem em curadoria musical, reforçam a interatividade e espalham a mesma energia no FM e nas plataformas digitais — colherão audiências cada vez mais fiéis e valiosas. As que ignoram essa virada, apostando apenas no hit do momento, ver‑se‑ão cada vez mais distantes do coração do seu ouvinte.

O Rádio envelheceu e segue forte. Quem não percebeu ainda, está prestes a ficar para trás.

Por Gian Del Sent 
Proibida a reprodução sem os créditos 

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