O “oceano azul” do planejamento patrimonial está prestes a chegar ao fim. Uma das preocupações que emergem nesse contexto é o aumento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), um tributo estadual que incide sobre heranças e doações.
O ITCMD é um imposto estadual, previsto no artigo 155 da Constituição Federal, regulamentado por cada Estado da federação. A alíquota do ITCMD varia de Estado para Estado, com um teto (limite máximo) constitucional de 8%.
No entanto, a maioria dos Estados adota alíquotas inferiores a este limite, e tem entendimentos diferentes sobre a incidência desse tributo na vida das pessoas, especialmente quando a bens imóveis são direcionados às empresas, como uma forma de planejamento patrimonial que busca, entre outras coisas, dar dinamismo às relações das pessoas com seus bens. Independente da forma como as pessoas buscam organizar seu patrimônio, o ITCMD segue sendo uma fonte importante de receita para os Estados.
Embora o principal foco da Reforma Tributária já aprovada pelo Congresso seja a tributação sobre consumo, o PLP 108/2024 estabeleceu a necessidade de revisões na legislação do ITCMD pelos Estados.
Hoje em dia, o Brasil figura como um dos países que menos tributa heranças no mundo, com larga diferença para os países que figuram no topo da lista da OCDE, como França, Alemanha e Japão. Essa é uma das principais justificativas para que, a partir da virada do ano, o Senado Federal permita aos Estados aumentos progressivos e significativos nas alíquotas do ITCMD.
A tempestade perfeita se completa com um grande apetite do Governo Federal no sentido de compensar a perda na arrecadação de Estados com a Reforma Tributária. Sai o ICMS, vem com tudo o ITCMD. Esses são os ventos que sopram de Brasília.
Algumas iniciativas legislativas sugerem a elevação da alíquota – de forma progressiva – de 8% para 16%. Recentemente, novos rumores tem surgido sobre vincular alíquota do ITCMD com a tabela do Imposto de Renda, o que elevaria ainda mais o teto máximo da alíquota para 27,5%.
É quase certo que a próxima virada do ano apresentará significativo aumento nas alíquotas do ITCMD, resultando uma carga tributária mais pesada para herdeiros e doadores. Isso pode desincentivar a doação em vida e aumentar os custos associados à transferência de patrimônio por herança ou doação, mecanismos comuns no planejameno patrimonial e sucessório das holdings.
Embora o ITCMD seja visto como um instrumento de redistribuição de riqueza, alíquotas mais elevadas podem afetar de forma desproporcional as famílias de classe média que herdam ou recebem doações de valores menores.
Por isso, a organização patrimonial e familiar em torno das holdings ganhou notoriedade, porque apresenta ao plano familiar uma solução legítima e viável economicamente. É comum que os planejamentos nesse sentido apresentem menores custos e previsibilidade na sucessão dos herdeiros. Muito ao contrário dos intermináveis inventários que, embora com muito patrimônio, ficam anos amargando prejuízo por ausência da liquidez necessária para saldar obrigações fiscais.
A última metade do ano promete uma verdadeira corrida contra o tempo. Alguns projetos conseguirão antecipar as mudanças, outros, pela própria complexidade dos planejamentos patrimoniais, terão que encarar uma nova fase das holdings num cenário em que o oceano azul poderá se tornar uma tempestada (im) perfeita.
Victor Domingues
Advogado, Mestre e Doutor em Direito e Desenvolvimento Econômico
@victordomingz